palavras ditas a ti

palavras unicamente palavra que pintam a vida

Monday, September 08, 2014

No coraçao ....

no coração não há rótulos nem nomes nem palavras a mais ou a menos.
ou bate descompassado ou na monotonia.
tu é que escolhes o compasso, as notas, a pauta com que te reges. és maestro.

*hoje li-te palavras que me atordoaram*

há pessoas que se cruzam connosco num misto de coincidência e magia.
acontecem instantes impossíveis de ignorar, de contornar.
e essa sinfonia é a mais bela que ouvirás.

não te confundas, não penses que toda a poesia é feita de amor.
ela é feita de vida, vida exuberante, plena de si mesma.

Friday, September 05, 2014

ELOGIO AO AMOR - PARA MEDITAR

Elogio ao amor (Miguel Esteves Cardoso - Expresso )

"Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa
para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser,
por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é
mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro.
Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo. O
que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se
apaixona
de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita
amar
sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática.
Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado.
Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais
barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das
calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de
antemão,
fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a
ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios.
Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa
variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem.
A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se
uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem
de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.
Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do
amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas,
farto
de compreensões, farto de conveniências de serviço.
Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os
de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de
ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá
bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos,
bananóides,
borra-botas, matadores do romance, romanticidas.
Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim,
a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um
cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha.
Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a
pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso
"dá
lá um jeitinho sentimental".
Odeio esta mania contemporânea por "sopas e descanso". Odeio os novos
casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria,
maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao
pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse
perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar,
não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma
questão de azar. O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente
ao céu,
a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto.
O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha"
é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é
um
princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição.
Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe.
Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a
nossa alma. É a nossa alma a desatar... A desatar a correr atrás do que não
sabe,
não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade. É por isso que
a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e
minta
e sonhe o que quiser.
O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais
bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração
apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil,
por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E
durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela
que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem.
Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se
ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver
sozinho,
triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder.
Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a Vida
inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E
valê-la também."